quarta-feira, 5 de setembro de 2018

Moiras, Senhoras do Destino!



As Moiras do grego “Μοῖραι”, na mitologia grega, são as três irmãs divinas que determinavam o destino, tanto dos deuses, quanto dos seres humanos. Eram três mulheres lúgubres, responsáveis por fabricar, tecer e cortar aquilo que seria o fio da vida de todos os indivíduos.

Durante o trabalho, as moiras fazem uso da Roda da Fortuna, que é o tear utilizado para se tecer os fios. As voltas da roda posicionam o fio do indivíduo em sua parte mais privilegiada (o topo) ou em sua parte menos desejável (o fundo), explicando-se assim os períodos de boa ou má sorte de todos. As três deusas decidiam o destino individual dos antigos gregos, e criaram Têmis, Nêmesis e as erínias. Pertenciam à primeira geração divina (os deuses primordiais), e assim como Nix, eram domadoras de deusas e homens.


As moiras eram filhas de Moros e Ananque. Moira, no singular, era inicialmente o destino. Na Ilíada, representava uma lei que pairava sobre deuses e homens, pois nem Zeus estava autorizado a transgredi-la sem interferir na harmonia cósmica. Na Odisseia aparecem as fiandeiras.

O mito grego predominou entre os romanos a tal ponto que os nomes das divindades caíram em desuso. Entre eles eram conhecidas por Parcas chamadas Nona, Décima e Morta, que tinham respectivamente as funções de presidir a gestação e o nascimento, o crescimento e desenvolvimento, e o final da vida; a morte; notar entretanto, que essa regência era apenas "sobre os humanos".

Os poetas da antiguidade descreviam as moiras como donzelas de aspecto sinistro, de grandes dentes e longas unhas. Nas artes plásticas, ao contrário, aparecem representadas como lindas donzelas. As Moiras eram:

    Cloto (Κλωθώ; klothó) em grego significa "fiar", segurava o fuso e tecia o fio da vida. Junto de Ilitia, Ártemis e Hécate, Cloto atuava como deusa dos nascimentos e partos.
    Láquesis (Λάχεσις; láchesis) em grego significa "sortear" puxava e enrolava o fio tecido, Láquesis atuava junto com Tique, Pluto, Moros e outros, sorteando o quinhão de atribuições que se ganhava em vida.
    Átropos (Ἄτροπος; átropos) em grego significa "afastar", ela cortava o fio da vida. Átropos, juntamente a Tânato, Moros e as queres, determinava o fim da vida.

Moiras na Teogonia:

As Moirai (na tradução latina, as Parcas), "a quem mais deu honra o sábio Zeus" (v. 904), fixam aos homens mortais os seus lotes de bem e de mal. Enquanto filhas de Zeus e Thémis, as Moirai representam a Fatalidade sob o aspecto positivo de configuração e ordenação dos destinos humanos segundo um peso e medida divinos; sob o aspecto negativo, essas Moirai são filhas  da  Noite  (vv.  217-9) e  representam  a sofrida experiência do restrito e inexorável lote de bem e de mal a que cada homem tem que se submeter como seu único destino.

As Hórai regram a Natureza, o tempo e as ações humanas integrando-os num todo uno e indiviso, que será harmonioso ou terrível segundo nele os homens concorram com ou sem o senso de justiça. As Moirai regram o que de bem e de mal aos homens é dado viver, segundo uma medida divina pela qual a vida humana (feliz ou desventurada) encontra sua razão de ser e se integra na ordem maior de Zeus.

A Moira, i.e., o lote ou o quinhão partilhado, é esse limite ôntico pelo qual a essência mesma de cada Deus se delimita e se configura como tal. A Moîra, portanto, está acima de cada Deus-centro ao mesmo tempo que é esse próprio Deus-centro. E enquanto a Moira está acima de cada Deus-centro ela se identifica  com  a  vontade  de  Zeus,    que  é  a  vontade  de  Zeus  que determinou (ou determina: aqui cessa toda compartimentação do tempo em presente, passado e futuro) a Grande Partilha e, nessa Grande Partilha, a constituição  de  cada  parte,  i.e.,  Zeus  determinou  (determina)  o  Grande Dasmós (vv. 73-4, 112 e 885) e, no Grande Dasmós, a constituição de cada moira. (E além de árbitro do Grande Dasmós, Zeus é o cônjuge de Eury- nóme, a Grande-Partilha, e é cônjuge de Thémis, com a qual procria as Moirai, as partes ou lotes.)
Não adianta  estabelecermos  aqui  uma  sistematização  e  classificação conceituais dos vários sentidos com os quais a palavra Moira vigorou entre os gregos na Época Arcaica, porque na Época Arcaica em que todos esses sentidos vigoraram eles não se deixaram, em seu vigor, nem se sistematizar nem se classificar conceitualmente, e essa sistematização e classificação não vão  nos  auxiliar  a  compreender  o  vigor  em  que  a  Moira  pôde  viger  e configurar um Mundo Divino.

Hesíodo põe as Moirai simultaneamente em duas linhagens diferentes que, por suas naturezas e modos de procriação diversos, em nada se tocam, em nenhum  momento  se  miscigenam:  as  Moîrai  são  filhas  da  Noite cissiparidas (vv. 217-9) e são filhas da união de Zeus e Thémis (vv. 904-6). Com essa  origem  dupla  e  antinômica,  as  Moirai  são  o  limite  positivo, constitutivo e configurativo de cada ser divino ou humano e — e por isso mesmo — são o limite negativo, coercitivo e cancelante: elas afirmam tudo o que um ser é e pode ser e negam tudo o que ele não é e não pode ser. A afirmação do que é e pode ser é já em si mesma a negação do que não é nem pode  ser.  A dupla filiação das  Moirai  indica,  nos  termos  próprios  do pensamento mítico, que toda afirmação implica a negação (omnis affirmatio est negatio).
A Moira, que constitui cada ser divino ou humano e com ele coincide enquanto é esse lote de opulência e de valor partilhado (áphenos kaì timás, cf. v. 112), exprime-se em cada ser divino ou humano como a sua mais autêntica e própria expressão. No entanto, a Moira, enquanto é para cada ser o seu próprio ser, constitui para cada Ser todas as coerções e imposições que se pode padecer e sentir como vindas disso que não se é mais por si próprio; e a Moira é, para cada ser, tudo o que provém de seu além-ser, tudo o que lhe é exterior e Outro.

Na Moîra (i.e., nesse lote, nesse horizonte individual particular que se delimita à parte da Totalidade Cósmica), afirmação e negação, liberdade e necessidade, espontaneidade e coerção, ipseidade e alteridade coincidem e são ao mesmo tempo no mesmo lugar sob o mesmo aspecto uma e mesma (mia kaì he auté, segundo o vocabulário que, no século seguinte a Hesíodo, Heráclito elabora para expressar no novo discurso inaugurado pela polis e pelo  uso  do  alfabeto  uma  das  intuições  fundamentais  da  sensibilidade religiosa grega).

Não    um  vínculo  genealógico  direto  entre  Memória  e  as  Moirai. Enquanto filhas de Zeus e Thémis, as Moirai são sobrinhas (e num certo momento enteadas) de Memória. Enquanto filhas da Noite, as Moirai são um pólo oposto de Memória, pertencentes à raça da Negação-de-Ser.

Assim como as Musas nascem de Memória e Zeus para serem o Canto ontofânico mas também o meôntico Oblívio (v. 55), as Moirai de dúplice e antinômica origem têm, também, a mesma relação ambígua com a Memória.

As Musas trazem à luz e presentificam o que é, recolhendo-o por força de Memória e redimindo-o das trevas obliviais do Não-Ser — mas as Musas também presidem ao Esquecimento e impõem-no, quando assim querem (eut' ethélomen, v. 28). As Moirai definem e circunscrevem o ser (i.e., o nascimento-natureza) de cada Deus e por isso mesmo impõem a cada Deus que  ele  não  seja  o  que  ele  não  é  e  não  pode  ser.  Há, portanto, um paralelismo entre a função das Musas e a das Moirai.

A ação das Musas na manutenção do ser de cada ser se dá na ordem da temporalidade e da ontologia. A ação das Moirai na manutenção do ser de cada ser se dá na ordem da espacialidade e da ontologia. Mas temporalidade e espacialidade não têm, na Teogonia, de modo algum o caráter quantitativo com o qual hoje entendemos essas categorias: elas aí são qualitativas e, se não exclusivamente qualitativas, são precipuamente qualitativas. O espaço e o tempo são sempre e sobretudo qualificados e instaurados pelo nascimento- natureza do Deus cuja epifania os instaura. Tempo e espaço na Teogonia são antes adjetivos que substantivos.

Moîra e Musas presidem igualmente a função de Memória. Esta Deusa, cujo ser (= nascimento-natureza) explicita o Ser-Fundamento da Terra-Mãe e do Céu luminoso e fecundador, não é uma Memória individual que deva conservar (e servir a) vicissitudes e singularidades factuais restritas à história de um indivíduo, — é sim uma Memória cosmo-gônica, é uma Divindade cujo  ser  é  dado  por  esse  mesmo  mo(vi)mento  da  ordem  ao  Mundo  (o momentum cosmogônico). Assim também, Moira é o princípio individuante, mas só o é na medida em que é um princípio mundificante.

Pela função de Moira, o ser individual só se constitui com o constituir-se do ser mundial: nenhum indivíduo é o que é sem que simultaneamente todos os kósmoi da Totalidade Cósmica estejam constituídos como tal. Por isso, o indivíduo nunca é ele mesmo num restrito insulamento, mas todo indivíduo se  constitui numa  manifestação  divina por força  e  função  das potências cosmogônicas e cosmofânicas: Moîrai e Musas, Zeus e Memória, Terra e Céu ladeados por Kháos e Éros.

Hinos ás Moiras:
Hino Órfico 59 - Às Moiras (Destinos), com fumigação de aromáticos:

Filhas da noturna Nyx, renomadas, aproximem-se, infinitas Moiras, e ouçam a minha prece; vós que no lago celeste, onde as águas brancas irrompem de uma fonte escondida nas profundezas da noite, e através de uma caverna escura e pedregosa deslizam, em uma caverna profunda, residem invisíveis; de onde, em largo curso em volta da Terra sem limites, vosso poder estendeis a aqueles de nascimento mortal; aos homens que se enchem de esperança, levianos, alegres, uma raça presunçosa, nascida apenas para se decompor. A esses se unindo, em um véu púrpuro impenetrável aos sentidos, vós vos ocultais, quando no plano da Moira cavalgais em júbilo em um grande carro, com glória por vosso guia; até que tudo se complete, vosso redondo céu apontado, em justiça, esperança, e concluso laço de cuidado, os prazos absolvidos, prescritos pela antiga lei, de poder imenso, e simplesmente sem uma falha. Pois as Moiras sozinhas com visão irrestrita supervisionam a conduta da espécie humana. A Moira é o olho eterno e perfeito de Zeus, pois Zeus e a Moira discernem todas as nossas ações. Vinde, poderes gentis, bem-nascidas, benignas, famosas, Atropos, Lakhesis e Cloto chamadas; imutáveis, aéreas, que vagueiam pela noite, indômitas, invisíveis à vista mortal; Moiras que tudo produzem, que tudo destroem, ouçam, considerem o incenso e a prece sagrada; escutem estes ritos inclinadas a serem propícias, e afastem para longe a aflição, com mente plácida.
(tradução da Alexandra, do inglês de Taylor)

Lira Grega V, Anônima, Fragmento 1018, da Antologia de Stobaeus:

Ouçam, Moiras (Destinos), que dos deuses se sentam mais próximas ao trono de Zeus e tecem em lançadeiras adamantinas incontáveis e inescapáveis esquemas de desígnios de todos os tipos. Aisa, Klotho e Lakhesis, filhas bem-armadas de Nyx (Noite), ouça nossas preces, vós que sois toda-terríveis deidades do céu e do mundo inferior; enviai-nos a rósea-florescida Eunomia (Ordem) e suas irmãs de trono brilhante Dike (Justiça) e Eirene (Paz) que usa a grinalda, e faça esta cidade esquecer-se de seus infortúnios que pesam ao coração.
(tradução de Alexandra, do inglês de Campbell)

Hino Órfico 59: Moiras [Partes/Destinos]
<Μοιρῶν>, θυμίαμα ἀρώματα.
Μοῖραι ἀπειρέσιοι, Νυκτὸς φίλα τέκνα μελαίνης,
κλῦτέ μου εὐχομένου, πολυώνυμοι, αἵτ' ἐπὶ λίμνης
οὐρανίας, ἵνα λευκὸν ὕδωρ νυχίας ὑπὸ θέρμης
ῥήγνυται ἐν σκιερῶι λιπαρῶι μυχῶι εὐλίθου ἄντρου,
ναίουσαι πεπότησθε βροτῶν ἐπ' ἀπείρονα γαῖαν· (5)
ἔνθεν ἐπὶ βρότεον δόκιμον γένος ἐλπίδι κοῦφον
στείχετε πορφυρέηισι καλυψάμεναι ὀθόνηισι
μορσίμωι ἐν πεδίωι, ὅθι πάγγεον ἅρμα διώκει
δόξα δίκης παρὰ τέρμα καὶ ἐλπίδος ἠδὲ μεριμνῶν
καὶ νόμου ὠγυγίου καὶ ἀπείρονος εὐνόμου ἀρχῆς·(10)
Μοῖρα γὰρ ἐν βιότωι καθορᾶι μόνη, οὐδέ τις ἄλλος
ἀθανάτων, οἳ ἔχουσι κάρη νιφόεντος Ὀλύμπου,
καὶ Διὸς ὄμμα τέλειον· ἐπεί γ' ὅσα γίγνεται ἡμῖν,
Μοῖρά τε καὶ Διὸς οἶδε νόος διὰ παντὸς ἅπαντα.
ἀλλά μοι εὐκταῖαι, μαλακόφρονες, ἠπιόθυμοι, (15)
Ἄτροπε καὶ Λάχεσι, Κλωθώ, μόλετ', εὐπατέρειαι,
ἀέριοι, ἀφανεῖς, ἀμετάτροποι, αἰὲν ἀτειρεῖς,
παντοδότειραι, ἀφαιρέτιδες, θνητοῖσιν ἀνάγκη·
Μοῖραι, ἀκούσατ' ἐμῶν ὁσίων λοιβῶν τε καὶ εὐχῶν,
ἐρχόμεναι μύσταις λυσιπήμονες εὔφρονι βουλῆι. (20)
{Μοιράων τέλος ἔλλαβ' ἀοιδή, ἣν ὕφαν' Ὀρφεύς}

Fumigação: Ervas Aromáticas

Moiras infinitas, prole amável da Noite Negra,
ouvi as minhas preces, Deusas de muitos nomes que habitais
um lago no céu, onde a noite tépida faz irromper a água branca
no mais profundo de uma rochosa gruta, a brilhar nas trevas*.
Daí revoais para a terra infinita dos mortais, (5)
a raça humana tão nobre quanto vã nas esperanças
marchando encobertas em rubros véus pelo
vale da morte, por onde a Glória vos guia o carro enorme
como a terra, para além da justiça, da esperança e das ânsias,
para além da lei primeva e do infinito poder de ordem. (10)
Só a Moira vê a vida por completo, e nenhum outro
imortal que tem a cabeça do nevoento Olimpo,
e o olho perfeito de Zeus. O que nos ocorre,
tanto a Moira quanto a mente de Zeus tudo sabem totalmente.
Eia, vinde a mim em oração, suaves no espírito, gentis no coração! (15)
Inflexível [Átropos] e Distributriz [Láquesis], Fiandeira [Kloto], filhas de bom pai!
aéreas invisíveis, inalteráveis e para sempre indestrutíveis,
doadoras de tudo, arrebatadoras de tudo, inevitáveis aos mortais!
Moiras, ouvi meus votos e libações, vinde aos mistérios
sendo alívio das dores, com benévolos desígnios.(20)
{Chegou ao fim a Canção das Moiras, que Orfeu compôs}
Trad. Rafael Brunhara

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