terça-feira, 14 de agosto de 2018

Deusa Egípcia Sekhmet, Senhora da Destruição e Patrona da Medicina


Na mitologia egípcia Sekhmet, Sachmet, Sakhet, Sekmet ou Sakhmet ("a poderosa") é a deusa da vingança e das doenças para os egípcios antigos.

Uma mulher com cabeça de leoa, encimada pelo disco solar, representava a deusa Sekhmet, a qual simbolizava o calor e os poderes destrutivos do Sol e protegia o faraó em sua tumba. Era respeitada como aquela que traz a destruição para os inimigos de Rá. Embora fosse uma leoa sanguinária, também operava curas e tinha um frágil corpo de moça. Era a deusa cruel da guerra e das batalhas e tanto causava quanto curava epidemias, sendo a patrona dos médicos. Essa divindade feroz era adorada na cidade de Mênfis, onde formava a tríade menfita juntamente com Ptah, seu esposo, e Nefertem, seu filho. Às vezes era fundida a Bastet, a deusa gata, e muitas vezes era identificada com Mut, a esposa de Amon.

Sua juba, dizem os textos, era cheia de chamas, sua espinha dorsal tinha a cor do sangue, seu rosto brilhava como o sol... O deserto ficava envolto em poeira, quando sua cauda o varria...

O extermínio dos humanos:
Nenhum tesouro do mundo é inesgotável. De tanto fazer favores aos homens, de tanto distribuir suas riquezas, Rá foi se empobrecendo. Além disso, foi envelhecendo lentamente, como não podia deixar de acontecer. Primeiro, seus ossos foram endurecendo e se transformando em prata. Suas carnes se transformaram em ouro e seus cabelos em lápis-lazúli, uma pedra azul cor do mar. O corpo de Rá se curvou, ele passou a andar de bengala. Sua boca tremia e soltava uma baba que corria até o chão...

Rá já não conseguia disfarçar sua decadência. Um belo dia os homens começaram a reparar:

- Vejam só como Sua Majestade envelheceu.
- Pois é, Rá mal consegue se manter de pé.
- Se não fosse a bengala, ele nem poderia andar.

De inicio Rá fazia de conta que nem ouvia. Mas os comentários foram se espalhando por todo o Egito e ele resolveu tomar uma atitude. Então ordenou a seu séquito:

- Convoquem imediatamente meu Olho divino, Shu e Tefnut, Geb e Nut, os deuses-pais e as deusas mães que estavam comigo no oceano primordial, ao lado do deus Nun. Quero que cada um traga todos que fazem parte do seu circulo. Mas façam isso em segredo e digam que irei recebê-los no Palácio do Príncipe. Vamos, depressa!

Todos compareceram. Vieram os ancestrais de Rá. Vieram também os que estavam nas Águas do início, esperando a hora de manifestar-se: seus filhos, Shu e Tefnut, e seus netos, Geb e Nut. Todos se colocaram dos dois lados do trono de ouro, se prosternaram com o rosto virado para o chão, conforme manda o protocolo, e Rá falou:

- Óh Nun, e vocês, deuses ancestrais. Tenho ouvido tudo o que dizem contra mim os homens que nasceram do meu olho. Seus comentários são um atentado contra a minha dignidade. Como castigo, estou pensando em massacrá-los. O que vocês acham?

Nun, que era o mais velho respondeu primeiro.

- Rá, meu filho e deus maior do que o deus que te criou, deixe-me lhe dizer uma coisa. Por certo, é preciso punir os culpados. Mas antes é preciso haver um julgamento justo, de acordo com as regras. Depois disso, teu Olho poderá agir com legitimidade e semear o terror entre aqueles que te desrespeitaram.

- Ouvi seu conselho, Nun. Mas acho que, ao perceber todo o aparato solene da justiça, os homens vão desconfiar da sorte que os aguarda. Apavorados com a ideia de serem julgados pelos nossos tribunais, eles correrão para se refugiar nas areias vermelhas do deserto. Você sabe muito bem que aquelas terras áridas e quentes não nos favorecem. Elas oferecem proteção inviolável aos fujões.

Os deuses se entreolharam, meneando a cabeça. Não havia como negar, Rá tinha razão. E toda a assembléia concordou com a execução sumária.

- O carrasco será seu Olho divino, Rá. Nenhum Olho é mais temível que o teu, quando assume a forma do poder, a terrível leoa Sekhmet.

Na mesma hora a deusa fera rugiu e se lançou sobre os homens, que pareciam formigas minúsculas. Todos corriam desesperados, tentando se esconder, mas acabavam sendo massacrados pelas garras afiadas da leoa feroz. Sekhmet saltava e rugia enfurecida, tingindo a terra do Egito de sangue.

A matança continuou até que Rá decidiu interferir.

- Agora pare com este extermínio. Nunca desejei destruir estas pessoas. Só quis dar-lhes um castigo.

- Ora, não falaste em massacre? Pois agora que eu me embriaguei com o sangue dessa gente ferida e dilacerada estás querendo me privar do prazer? Não devias ter me deixado sentir o gosto...

Furiosa, com a bocarra espumando, a deusa-leoa voltou a sua obra assassina, iniciada ali mesmo, na cidade de Heliópolis. Ao chegar perto de Heracleópolis, a noite caiu. Sekhmet resolveu descansar, com intenção firme de continuar sua tarefa, assim que acordasse.

Para Rá, aquele havia sido um dia desastroso. Ele sabia que no dia seguinte, logo ao amanhecer, a leoa recomeçaria o massacre. Pediu então que lhe arranjassem mensageiros rápidos e ágeis, com pés de vento. Obedecendo ás ordens do deus, esses mensageiros foram até Elefantina, de onde voltaram trazendo grande quantidade de planta chamada mandrágora. O moleiro de Heliópolis foi encarregado de socar as plantas enquanto algumas criadas moíam e esmagavam grãos de cevada, um cereal usado para fazer cerveja. Depois misturaram a cevada e a mandrágora com o sangue dos homens, enchendo assim sete mil cântaros de cerveja. Rá fez questão de provar a bebida.

- Muito bem – ele disse. – É exatamente o que eu queria.

Com isso vou salvar os homens. Minha gente peguem estes cântaros e sigam pelo caminho de Heracleópolis, até encontrarem a leoa adormecida.

- Mas, majestade, é noite escura!

- Tudo bem, na hora necessária vou fazer clarear um pouco, bem antes do amanhecer! Vamos, depressa!

Assim, lá foram os homens de Rá, ora andando, ora correndo, sempre seguindo a trilha de sangue da leoa. Muito antes de avistá-la, eles já ouviram seus roncos. Uma suave luz cor-de-rosa surgiu no céu, e eles despejaram o liquido no chão. Os campos e plantações foram inundados pela poção mágica, até uma altura de quatro palmos.

Chegou o amanhecer. A leoa se empertigou e esticou as patas, como a esfinge. Entreabriu os olhos e se espreguiçou. Já seguindo o gostinho da carnificina que iria continuar, ela farejou o vento. Por Rá! Imediatamente a expressão da deusa suavizou. Ela encolheu as garras e começou a lamber a bebida inebriante espalhada a seu redor. Bebeu, bebeu, esquecendo-se completamente dos homens, e foi se embora cambaleando. O perigo estava afastado. Mas só por algum tempo. Passada a bebedeira, com certeza a deusa-leoa voltaria a atacar, mais furiosa ainda.

Então, Rá tomou medidas mais permanentes. Ordenou que todos os dias do ano os homens preparassem cântaro daquela bebida para cada sacerdotisa do Sol. Esse ritual seria um meio das gerações futuras lembrarem a infeliz história dos seus ancestrais e de aplacar a sede insaciável da deusa-leoa.”

Durante o reinado de Amenófis III (c. 1391 a 1353) foram esculpidas numerosas estátuas dessa deusa. Tantas, que hoje em dia todos os museus de egiptologia do mundo conservam pelo menos um exemplar de tais peças. Embora sejam todas oriundas da mesma pedreira, variam por suas dimensões, por seu grau de acabamento e pelo aspecto de suas máscaras leoninas. Apresentada sentada ou em pé, do tamanho de um ser humano ou bem maior, têm sempre o disco solar sobre a cabeça e geralmente trazem na mão o sinal da vida, ou seja, a cruz ansata (ankh). Nesta página vemos dois exemplares de tais esculturas, ambas de diorito. Provenientes de Tebas e pertencentes ao Museu do Louvre, a Sekhmet sentada tem 1,64 m de altura, enquanto que a altura da cabeça fragmentada é de 40,5 cm.

Ela é capaz de espalhar os flagelos, escreve Elisabeth Delange, Curadora de Antiguidades Egípcias do Museu do Louvre de desencadear sua cólera, selvagem e terrificante, na secura do deserto, mas ao mesmo tempo é ela quem destrói os inimigos do Estado, protege o corpo de Osíris e contribui para a manutenção da ordem cósmica.

A ambiguidade da personalidade da deusa prossegue a autora, simboliza na realidade o ritmo cíclico ao qual estava submetido o Nilo. Quando as chuvas africanas não o alimentavam mais, ele secava e parecia desaparecer ao longe nos espaços hostis. Aguardava-se o seu retorno, como um filho pródigo, pois é o Rio que procura o frescor e a vida, quando da inundação benéfica. Então a leoa indisciplinada se transformava em gata amena e doce. Assim nascem as lendas e os mitos que dão um sentido às realidades físicas misteriosas e sazonais.



Algumas referências literárias:


“Cada templo possuía uma biblioteca mágica onde se conservavam as obras necessárias às práticas rituais e ao ensino esotérico dos praticantes. Em Edfu, por exemplo, dispunham de obras para combater os gênios malignos, repelir o crocodilo, apaziguar Sekhmet, caçador de leões, proteger o faraó no seu palácio. O mago rege a sua vida cotidiana pelas leis cósmicas; por exemplo, “O dia vinte do primeiro mês da inundação é o dia de receber e de enviar cartas. A vida e a morte saem nesse dia. Faz-se nesse dia o livro “fim da obra”. É um livro secreto, que faz malograr os encantamentos, que detém e trava as conjuras e intimida todo o universo. Contém a vida, contém a morte”

“Igualmente magos, os sacerdotes da deusa leoa Sekhmet são especialistas em medicina e cirurgia. Práticos e conjuradores, a sua gama de competência vai da mais banal picadela de inseto ao mais grave traumatismo. Os seus êmulos mais modestos são curandeiros de aldeia, aptos a praticar os primeiros socorros.”

“Tudo que se encontra nos templos (estelas, baixos-relevos, mobiliário etc.), assim como nos túmulos, deve ser preservado magicamente. Quem ousasse levantar a mão sobre esses objetos ou sobre os decretos administrativos registrados nas paredes dos monumentos pereceria sob o gládio de Amon ou o fogo de Sekhmet, a deusa leoa.”

“O próprio Rê toma precauções quando viaja de barco para ir visitar a sua Enéade. Os “donos da Duat” estão prontos para castigar o crocodilo que se ergueria contra a barca divina. As bocas dos habitantes da água são fechadas por Rê, as gargantas fechadas por Sekhmet, as línguas cortadas por Thot, os olhos cegados por Heka, deus da magia. Os quatro deuses que protegem Osíris, protegem igualmente quem quer que afronte a água, homem ou animal.”

“As manifestações mais freqüentes desse fogo são as queimaduras. Não foi o próprio Hórus queimado pela chama da deusa leoa Sekhmet, de cólera temível?”

“A deusa Sekhmet, com cabeça de leoa, é temível. Reina sobre grupos de gênios emissários armados com instrumentos cortantes, que percorrem a terra trazendo consigo a doença, a fome, a morte, sobretudo durante os períodos delicados do calendário, nas épocas de transição em que o mal se precipita: a passagem de um ano para outro, o fim de uma década, o fim do mês e até o fim do dia e o início da noite. Essas hordas aterradoras são conjuradas pelos magos mais competentes, inicialmente a nível nacional, depois na esfera privada. Para apaziguar o furor de Sekhmet, é preciso utilizar um amuleto ou uma estatueta que represente a deusa. A força maléfica transforma-se então em benéfica, o poder desembaraça-se das suas escórias. No último dia do ano, a deusa leoa é invocada, lembrando o papel dos assassinos vindos do Olho mau que semearam o pânico e as trevas, que lançaram pela boca os seus dardos. Mas que se afastem do mago! Não terão poder sobre ele, porque ele é Rê, ele é a própria Sekhmet! As palavras são para ser recitadas num retalho de linho fino no qual estão desenhados os deuses. O mago oferece-lhes pão e cerveja, queima incenso, faz doze nós e coloca o tecido no pescoço de quem deseja ser protegido. Para afastar assassinos e incendiários de Sekhmet, o mago identificasse com Hórus, o único. Pronuncia fórmulas sobre um bastão de madeira que segura na mão. Deve em seguida sair da sua casa e dar a volta na construção.”

“Sob o reinado de Amenófis III foram esculpidas muitas estátuas da deusa Sekhmet. A deusa é qualificada como “aquela cujo poder é tão grande quanto o infinito”. Os epítetos presentes nas estátuas formam uma litania gigantesca que evoca uma Sekhmet-chama que repele a serpente e combate os inimigos do faraó. Uma força como essa é difícil de manipular, porque pode destruir o mundo. Mas é graças a ela que o faraó conserva a sua vitalidade. Está vivo entre os vivos, na condição de que Sekhmet seja apaziguada e dominada. Eis o motivo por que as estátuas de Sekhmet protegiam o acesso aos lugares sagrados, proibindo aos seres impuros e incapazes a entrada nos templos.”

“O ano ritual era encarnado pela serpente uraeus que, para simbolizar a multiplicidade dos dias, se desdobra em 365 serpentes dispostas em torno da coroa real. Ora, há 365 estátuas de Sekhmet (ou duas séries de 365): em cada dia é necessário conquistar os favores da deusa para que ela dispense uma energia positiva e proteja o faraó, o templo e até as moradias dos particulares.”

“"Eu queimo e solto fogo
e arremesso dardos dos meus olhos
Eu estouro e rujo
minhas arestas são afiadas
e eu corto fundo
minha energia é forte e fogosa
e meu desagrado
tem de ser manifestado.
Embora algumas vezes eu seja gentil
posso ser muito emotiva.
Uma vez provocada
sou difícil de descartar.
Sou sempre adequada
sempre necessária.
Não tente livrar-se de mim.
Preciso ser reconhecida e ouvida.
EU SOU A RAIVA."

“Leoa da destruição e vingança,
Meus inimigos me circundam, buscando minha queda.
Livre-me de suas influência. Conceda-me liberdade.
Ó Poderosa e Terrível, amada de Ptah.”

Fontes:
Christian Jacq
Fascínio Egito
Les plus belles legendes de La mythologie.
Wikipédia
T Rundle Clark

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