quarta-feira, 12 de setembro de 2018

Hécate. Senhora da Magia.




Hécate, do grego clássico: Ἑκάτη Hekátē ou Ἑκάτα Hekáta; transl.: Hekátē.

Epítetos: Aidônia (Senhora do Submundo), Anassa eneroi (Rainha dos que estão abaixo), Atalos (terna, delicada), Brimô (irritada, terrível), Ctônia (do submundo), Enodia/Einodia/Ennodia (das encruzilhadas, dos caminhos), Kleidouchos (mantenedora das chaves), Kourotrophos (cuidadora/nutridora dos jovens), Koré Mounogenês (donzela filha única), Krataiis (a forte), Liparokrêdemnos (de brilhante tiara no cabelo), Nyktipolos (que vaga pela noite), Perseis (filha de Perseu), Phosphoros (portadora da luz), Propylaia (guardiã), Soteira (Salvadora), Skylakagetis (líder dos cães), Tricephalus (de 3 cabeças), Trioditis/Trivia (dos 3 caminhos), Trimorphis (de três formas).


Símbolos: Tochas, chaves, corda, faca.
Ofertas: Teixo, cipreste, aveleira, álamo negro, mirra, algália, cânfora, babosa, sangue menstrual, mugem vermelha, pão, ovos, queijo, mel.
Animais: Cachorros pretos, touros pretos, cordeiros pretos, corujas, corvos, cobras, sapos.
Cores: Preto e vermelho.
Domínios: Bruxaria, Fantasmas
Plantas: Ervas, Asfódelo

Na mitologia grega, é uma deusa, naturalizada na Grécia micénica ou na Trácia, mas oriunda das cidades cárias de Anatólia, região onde se atestam a maioria dos seus nomes teofóricos, como Hecateu e Hecatomno, e onde Hécate era vista como Grande Deusa em períodos históricos, no seu inigualável lugar de culto em Lagina. Deusa das terras selvagens e dos partos, era geralmente representada segurando duas tochas ou uma chave, e em períodos posteriores na sua forma tripla. Estava associada a encruzilhadas, entradas, fogo, luz, a lua, magia, bruxaria, o conhecimento de ervas e plantas venenosas, fantasmas, necromancia e feitiçaria. Ela reinara sobre a terra, mar e céu, bem como possuía um papel universal de salvadora (Solteira). Ela era uma das principais deidades adoradas nos lares atenienses como deusa protetora e como a que conferia prosperidade e bênçãos diárias à família.

Hécate pode ter origem entre os Carianos na Anatólia, onde variações do seu nome são usadas para dar nome a crianças. William Berg observa, "Como as crianças não recebem nomes de espectros, é seguro assumir que os nomes carianos envolvendo hekat- referem-se a uma deidade principal livre da escuridão e de ligações com o submundo e bruxaria associadas à Hécate da Atenas clássica." Ela também parece associada à deusa romana Trivia, com a qual foi identificada em Roma.

Deusa aparentada a Artemis, não possui um mito próprio. Profundamente misteriosa, age mais em função de seus atributos. Embora descenda dos Titãs e seja portanto independente dos deuses olímpicos, Zeus, todavia, lhe conservou os antigos privilégios e até mesmo os aumentou. Em princípio, uma deusa benéfica, que derrama sobre os homens os seus favores, concedendo-lhes a prosperidade material, o dom da eloqüência nas assembléias, a vitória nas batalhas e nos jogos, a abundância de peixes aos pescadores. Faz prosperar o rebanho ou o aniquila, a seu bel-prazer. É a deusa nutriz da juventude, em pé de igualdade com Apolo e Artemis. Eis aí um retrato de Hécate na época mais antiga. Aos poucos, todavia, Hécate foi adquirindo características, atributos e especialização bem diferentes. Deusa Ctônia, passou a ser considerada como divindade que preside à magia e aos encantamentos. Ligada ao mundo das sombras, aparece aos feiticeiros e às bruxas com uma tocha em cada mão ou ainda em forma de diferentes animais, como égua, loba, cadela. Tida e havida como a inventora da magia, o mito acabou por fazê-la penetrar na família da bruxaria por excelência: Eetes, Circe e Medéia. É assim que tradições tardias fizeram-na Mãe de Circe e, por conseguinte, tia de Medéia. Como mágica, Hécate preside às encruzilhadas, local consagrado aos sortilégios. Não raro suas estátuas representam-na sob a forma de mulher com três corpos e três cabeças.

Hécate é a deusa dos mortos, não como Perséfone, mas como divindade que preside às aparições de fantasmas e senhora dos malefícios. Empunhando duas tochas e seguida de éguas, lobas e cadelas é a senhora todo-poderosa invocada pelas bruxas. Seu poder terrível manifesta-se particularmente à noite, à luz bruxuleante da Lua, com a qual se identifica. Deusa lunar e ctônia, está ligada aos ritos da fertilidade. Sua polaridade, no entanto, já foi acentuada: divindade benfazeja, preside à germinação e ao parto, protege a navegação, prodigaliza prosperidade, concede a eloquência, a vitória e guia para os caminhos órficos da purificação; em contrapartida, possui um aspecto terrível e infernal: é a deusa dos apavorantes. Mágica por excelência, é a senhora da bruxaria. Só se pode esconjurá-la por meio de encantamentos, filtros de amor ou de morte. Sua representação com três corpos e três cabeças presta-se a interpretações simbólicas de diferentes níveis. Deusa da lua pode representar-lhe três fases da evolução: crescente, minguante e lua nova, em correlação com às três fases da evolução vital. Deusa ctônia, ela reúne os três níveis: o infernal, o telúrico e o celeste e, por isso mesmo, é cultuada nas encruzilhadas, porque cada decisão a se tomar num trívio postula não apenas uma direção horizontal na superfície da terra, mas antes e especialmente uma direção vertical para um o para outro dos níveis de vida escolhidos.

A grande mágica das manifestações noturnas simbolizaria ainda o inconsciente, onde se agitam monstros, espectros e fantasmas. De um lado, o inferno vivo do psiquismo, de outro uma imensa reserva de energias que se devem ordenar, como o caos se ordenou em cosmo pela força do espírito.

A Hécate é que cabe a missão de chamar as Erínias vingadoras que se apoderam dos culpados. Hécate, divindade infernal, que preside os encantamentos e a magia, chama-se às vezes tripla Hécate, por se lhe estender o poder simultaneamente no céu, na terra e nos infernos. Aparece na arte como espécie de tríada composta de três mulheres. A primeira traz na cabeça o crescente da lua, e em cada mão um facho; a segunda tem a cabeça radiada e ornada de um gorro frígio; tem uma faca e uma serpente; finalmente, a terceira segura cordas e chaves.

Hécate não desempenha na Fábula papel nitidamente acentuado, e o seu caráter lunar fez com que, às vezes, a confundissem com Artemis. Fora está a primeira em perceber o rapto de Core [mais tarde Perséfone], e pusera-se a procurá-la com os seus fachos. Na guerra dos gigantes, colocara-se, apesar de pertencer ao partido dos Titãs, ao lado de Zeus, e matara com o fogo dos fachos o gigante Clítio. A cena está representada num baixo-relevo antigo, onde Hécate se distingue perfeitamente de Artemis que combate ao lado dela com o arco e as flechas. Aliás já não tem o caráter de tríada de que somente se reveste em determinadas ocasiões.

Hécate não era na origem uma divindade infernal, mas tendo emprestado uns disfarces a Europa, facilitando assim os amores de Zeus, tornou-se odiosa a Hera e foi obrigada, para evitar uma perseguição, a ocultar-se sob um lençol, o que a tornou impura. As cabiras, por ordem de Zeus, purificaram-na no Aqueronte, e desse modo passou a ser deusa do Tártaro. O seu papel nos infernos tem duplo aspecto. Como divindade vingadora, preside às expiações; como deusa da magia, preside os encantamentos, e é ela que envia à terra os monstros evocados dos infernos.

Hécate é a grande mágica que se invoca para os encantamentos: detém-se nas encruzilhadas, perto dos túmulos, e quando sente o cheiro de um crime, faz que ladrem os cães infernais que a acompanham.

"Hécate, diz Creuzer, quer dizer aquela que age de longe, ou aquela que afasta, que repele. Ofereciam-se-lhe sacrifícios expiatórios, espécies de lustrações domésticas feitas pela fumaça, celebradas no dia 30 de cada mês, e onde eram objetos essenciais ovos e jovens cães. Os restos (lesses animais e das demais ofertas, reunidos a muitos comestíveis, deviam ser expostos nas encruzilhadas, e diziam-se o festim de Hécate. Muitas vezes os pobres e os cínicos saqueavam esses restos com uma avidez que para os antigos era o sinal da extrema indigência ou da última baixeza. O cão era o animal consagrado a Hécate. Alguns monumentos mostram tal deusa tendo um cão ao colo, a quem parece acariciar. Representavam-na também com uma cabeça de cão, e talvez fosse aquela a sua antiga forma mística, a forma sob a qual era adorada nos mistérios da Samotrácia, onde se imolavam cães em sua honra. Hécate tinha também os seus mistérios, particularmente em Egina; e a instituição se prendia a Orfeu. Viam-se na ilha várias estátuas da deusa, uma das mãos de Miro, com um só rosto, outras com três, atribuídas ao famoso Alcameno."


Hécate na Teogonia.

No hino a Hécate (vv. 404-53), ao exaltar os poderes e privilégios dessa Deusa, Hesíodo diz que:

"de quantos Deuses nasceram da Terra e do Céu "e receberam honra, de todos ela obteve um lote; "nem o Cronida a violou nem a despojou
"do que recebeu entre os antigos Deuses Titãs,
"e ela tem como primeiro no começo houve a partilha." (vv. 421-5)

Portanto Hécate, no reinado de Crono, não se encontra no número dos "não-honrados" e "sem-prêmios" (cf. v. 395), mas, bem ao contrário, nesse reinado ela obtém um lote (ékhei aisan, v. 423) de quantos Titãs nascidos da Terra e do Céu receberam honra (timèn élakhon, v. 422). E os poderes de Hécate ainda se multiplicam,  porque,  no  reinado  de  Zeus,  ela  não  só conserva "o que recebeu dos antigos Deuses Titãs" (v. 421), mas também Zeus, além de honrá-la e conceder-lhe:

"esplêndidos dons,
"ter parte na terra e no mar infecundo" (vv. 412-3),
"afez nutriz de jovens que depois dela
"com os olhos viram a luz da multividente Aurora. "Assim dês o começo é nutriz de jovens (...)".(vv. 450-2)

Hécate    pode  ter  sido  "nutriz  de  jovens"  (kourotróphos)  por  uma outorga de Zeus que lhe tem valido "dês o começo" (ex arkhês), i.e. desde o seu nascimento, num universo cujos eventos não se organizam segundo o princípio  cronológico  do  antes-e-depois,  mas  segundo  o  princípio  crato- ontológico da força-de-ser.

Hécate, por obra de Zeus, já nasce nutriz de jovens (v. 452); e para que isso assim se dê, ela deve nascer na fase cósmica do reinado de Zeus (se não, como Zeus poderia lhe outorgar tão honrosa função?). No entanto, consoante diz o v. 414, "ela também do Céu constelado partilhou a honra" — e isto significa que Hécate transita para a fase cósmica em que o Céu ancestral copula desordenada e proliferantemente com a Terra-Mãe? — Pode ser. — De todo modo, os vv. 421-5 supracitados indicam claramente que ela vive honrada e apanagiosamente na fase cósmica do reinado de Crono.

Se    uma  sucessão  das  três  fases  cósmicas  numa  ordem  em  que primeiro há a do Céu primordial, depois há o kósmos de Crono e em terceiro a realeza de Zeus, — neste caso, Hécate remonta da última (reinado de Zeus) para  a  primeira  (reinado  do  Céu)  e  instala-se  na  segunda  (reinado  de Crono).—O  que  significa  que  essa  "sucessão"  não  é  uma  seqüência rigorosamente pautada pelo princípio cronológico do antes-e-depois.

Ou, então, Hécate — que é desde seu nascimento {ex arkhês) nutriz de jovens por outorga de Zeus — não nasce sob o reinado de Zeus; e, neste caso, a Grande Partilha (pela qual Zeus instaura e impõe a sua Ordem e a sua Justiça) determina e ordena fatos que, numa perspectiva cronológica pautada pelo antes-e-depois, deveriam dar-se antes dessa mesma Grande Partilha. — Donde se conclui que não tem sentido nem função na Teogonia o princípio cronológico do antes-e-depois. De fato, segundo uma leitura da Teogonia, de acordo com esse princípio o cruel comportamento de Crono para com seus filhos é motivado por uma decisão da vontade de um Zeus ainda por nascer. Crono, soberano, engolia os seus filhos, tão logo nasciam,

"pois soube da Terra e do Céu constelado
"que lhe era destino por um filho ser submetido "apesar de poderoso, por desígnios do grande Zeus". (v. 463-5)

Hino a Hécate na Teogonia vv.404-452

Febe entrou no amoroso leito de Coios e fecundou a Deusa o Deus em amor, ela gerou Leto de negro véu, a sempre doce, boa aos homens e aos Deuses imortais, doce dês o começo, a mais suave no Olimpo. Gerou Astéria de propício nome, que Perses conduziu um dia a seu palácio e desposou, e fecundada pariu Hécate a quem mais Zeus Cronida honrou e concedeu esplêndidos dons, ter parte na terra e no mar infecundo.

Ela também do Céu constelado partilhou a honra e é muito honrada entre os Deuses imortais. Hoje ainda, se algum homem sobre a terra com belos sacrifícios conforme os ritos propicia e invoca Hécate, muita honra o acompanha facilmente, a quem a Deusa propensa acolhe a prece; e torna-o opulento, porque ela tem força.

De quantos nasceram da Terra e do Céu e receberam honra, de todos obteve um lote; nem o Cronida violou nem a despojou do que recebeu entre os antigos Deuses Titãs, e ela tem como primeiro no começo houve a partilha. Nem porque filha única menos partilhou de honra e de privilégio na terra e no céu e no mar mas ainda mais, porque honra-a Zeus.

A quem quer, grandemente dá auxílio e ajuda, no tribunal senta-se junto aos reis venerandos, na assembléia entre o povo distingue a quem quer, e quando se armam para o combate homicida os homens, aí a Deusa assiste a quem quer e propícia concede vitória e oferece-lhe glória. Diligente quando os homens lutam nos jogos aí também a Deusa lhe dá auxílio e ajuda, e vencendo pela força e vigor, leva belo prêmio facilmente, com alegria, e aos pais dá a glória. Diligente entre os cavaleiros assiste a quem quer, e aos que lavram o mar de ínvios caminhos e suplicam a Hécate e ao troante Treme-terra, fácil a gloriosa Deusa concede muita pesca ou surge e arranca-a, se o quer no seu ânimo.

Diligente no estábulo com Hermes aumenta o rebanho de bois e a larga tropa de cabras e a de ovelhas lanosas, se o quer no seu ânimo, de poucos avoluma-os e de muitos faz menores. Assim, apesar de ser a única filha de sua mãe, entre imortais é honrada com todos os privilégios. O Cronida a fez nutriz de jovens que depois dela com os olhos viram a luz da multividente Aurora.

Assim dês o começo é nutriz de jovens e estas as honras.

 Hinos à Hécate:

Hino Órfico a Hécate
Enódia Hécate celebro, Trívia, amável,
celeste, terrestre e marinha, de cróceo véu,
tumular, celebrando baqueus entre almas de mortos,
Filha de Perses, amiga do ermo, que se ufana com cervos,
noturnal, protetora dos cães, rainha inflexível, (5)
do frêmito feral, sem armas, de forma incombatível,
pastora de touros, soberana detentora das chaves de todo o cosmo,
hegêmone, ninfa, nutriz de jovens, andarilha das montanhas.
Suplico, donzela, que compareças aos consagrados ritos,
benfazeja ao boiadeiro e sempre com um grato coração. (10)
(Tradução: Rafael Brunhara)

Hino Órfico a Hécate
Hécate Einodia, Trioditis [Trivia], amável dama,
da estrutura terrestre, aquática e celestial,
sepucral, em um véu de açafrão vestida,
satisfeita com fantasmas escuros que vagueiam pelas sombras;
Perséia, deusa solitária, saúdo-te!
Portadora da chave do mundo, nunca condenada a falhar;
em cervos rejubila-se, caçadora, vista noturnamente,
e arrastada por touros, inconquistável rainha;
Líder, Ninfa, enfermeira, a que vaga nas montanhas,
ouça os suplicantes que com ritos sagrados teu poder veneram,
e arraste-se para perto do vaqueiro com uma mente favorável.
(tradução da Alexandra)

Hino Órfico a Hécate:
À Hécate dos três caminhos / e encruzilhadas eu canto;
No céu, na terra e no mar, / de açafrão é seu manto.
Nas tumbas celebrando Baco, / se une às almas dos mortos;
Filha de Perses, solitária, / ela se delicia em cervos.
Irresistível rainha, / à noite ela os cães assiste;
Em grito às feras, desarmada, / a ela ninguém resiste.
Rainha e senhora do mundo, / de touro é sua tiara;
Líder das chaves, cuidadora, / pelas montanhas ela caça.
Seja presente, ó donzela, / em prece aos sagrados ritos;
Ao devoto sê propícia, / ó sempre alegre espírito.
(tradução da Alexandra)
 


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